PGBL e VGBL entram no Inventário? A Batalha Judicial contra a cobrança do ITCMD no Rio de Janeiro

Inventario

O planejamento sucessório moderno frequentemente utiliza planos de previdência privada, como o Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) e o Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL), como ferramentas para garantir a segurança financeira dos beneficiários após o falecimento do titular. Contudo, uma dúvida crucial atormenta os planejadores e herdeiros: os valores acumulados nesses planos são considerados herança e, portanto, devem ser tributados pelo Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD)? No Rio de Janeiro, essa questão transformou-se em uma verdadeira batalha jurídica, com o Fisco de um lado e os contribuintes do outro.

A controvérsia foi instaurada pelo próprio Estado, com base no Artigo 23 da Lei Estadual nº 7.174/2015. Este dispositivo legal previa expressamente a incidência do ITCMD sobre os saldos de PGBL e VGBL transmitidos aos beneficiários por ocasião da morte do titular. A justificativa da Fazenda Estadual era de que tais planos possuiriam a natureza de um mero investimento financeiro ou aplicação de capital, devendo, portanto, integrar o espólio e sofrer a devida tributação, assim como qualquer outro ativo deixado pelo falecido.

Essa interpretação, contudo, colide frontalmente com a natureza jurídica desses produtos, especialmente o VGBL. A Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) classifica o VGBL como um seguro de pessoa. Essa caracterização é fundamental, pois atrai a aplicação de uma regra basilar do Direito Civil brasileiro, contida no Artigo 794 do Código Civil: o capital estipulado em um seguro de vida não é considerado herança para nenhum efeito legal. Isso significa que ele não responde por dívidas do falecido e, mais importante, não deveria se submeter ao processo de inventário nem à tributação por ele gerada.

Diante desse conflito entre a lei estadual e a legislação federal, os contribuintes buscaram a proteção do Poder Judiciário. A questão escalou até que o próprio Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em uma decisão de enorme repercussão, declarou a inconstitucionalidade do referido Artigo 23 da lei fluminense. Os desembargadores entenderam que o Estado do Rio de Janeiro, ao tentar tributar os planos de previdência, extrapolou sua competência tributária, criando um fato gerador de imposto sobre algo que, por definição legal, não constitui transmissão de herança.

A importância de uma assessoria jurídica especializada neste cenário é inquestionável. Foi a atuação técnica de advogados que permitiu levar a tese da não incidência ao Judiciário, construindo uma argumentação sólida baseada na hierarquia das leis e na natureza securitária dos contratos. Sem essa intervenção, muitos contribuintes teriam simplesmente acatado a cobrança imposta pela Fazenda, sofrendo uma perda patrimonial indevida e significativa, que poderia comprometer o propósito original do planejamento sucessório.

Consolidando essa vitória para os cidadãos, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), corte máxima para a interpretação da lei federal no país, pacificou o entendimento em âmbito nacional. Em um julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.214), o STJ firmou a tese de que é inconstitucional a incidência do ITCMD sobre os valores de PGBL e VGBL decorrentes do falecimento do titular. Essa decisão tem efeito vinculante, ou seja, deve ser seguida por todos os juízes e tribunais do Brasil, pondo uma "pá de cal" na pretensão dos estados de tributar tais verbas.

A análise de um acórdão recente da Justiça fluminense, proferido já em 2025, ilustra perfeitamente o cenário atual. No caso, o Estado do Rio de Janeiro insistia na cobrança do imposto sobre um saldo de VGBL, mas o recurso foi negado de forma contundente. O relator do caso fundamentou sua decisão citando não apenas a jurisprudência consolidada do STJ, mas também a prévia declaração de inconstitucionalidade do Artigo 23 pelo próprio tribunal local, reafirmando que os valores de VGBL não integram a herança e, portanto, estão fora do campo de incidência do ITCMD.

Em suma, a resposta à pergunta inicial é clara: no Estado do Rio de Janeiro e em todo o Brasil, os valores recebidos por beneficiários de planos PGBL e VGBL, em decorrência da morte do titular, não são considerados herança, não entram no inventário e não podem ser tributados pelo ITCMD. Essa é uma conquista da cidadania, viabilizada pela atuação estratégica da advocacia especializada, que soube defender a correta aplicação da lei contra uma exigência fiscal inconstitucional, garantindo a integridade do planejamento sucessório e a proteção do patrimônio familiar.