BPC/LOAS para Pessoas em Situação de Rua: Um Direito à Dignidade

LOAS BPC INSS

Uma das dúvidas mais recorrentes no campo do direito assistencial é se uma pessoa em situação de rua, sem um endereço fixo para comprovar, pode ter acesso a benefícios do governo. A resposta é um enfático sim. A ausência de um lar, longe de ser um impedimento, é a mais contundente prova da extrema vulnerabilidade social que o Benefício de Prestação Continuada (BPC), previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), visa combater.

Trata-se de um mecanismo fundamental de cidadania, que reconhece a dignidade humana acima de qualquer formalidade burocrática, como a posse de uma residência.

É crucial desmistificar a ideia de que a comprovação de residência é um requisito universal para todos os direitos. No caso do BPC/LOAS, a lógica é invertida: a falta de um domicílio evidencia a condição de desamparo que justifica a proteção do Estado. A legislação brasileira, em especial o Decreto nº 7.053/2009, que institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua, veda expressamente qualquer tipo de discriminação baseada na ausência de um endereço, garantindo o acesso simplificado aos serviços e programas sociais.

Para compreender esse direito, é preciso recordar os pilares do BPC/LOAS. Este benefício assistencial, no valor de um salário mínimo mensal, destina-se a dois grupos específicos: idosos com 65 anos ou mais e pessoas com deficiência de qualquer idade, desde que esta cause impedimentos de longo prazo (mínimo de 2 anos). Além disso, é exigida a comprovação de que a pessoa não possui meios de prover a própria subsistência, nem de tê-la provida por sua família, um estado de miserabilidade que é inerente à vida nas ruas.

O primeiro e mais importante passo para que a pessoa em situação de rua possa requerer o BPC é a sua inscrição no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico). Este cadastro é a porta de entrada para dezenas de políticas públicas. Contrariamente ao que se possa pensar, não é necessário ter um endereço para se cadastrar. O sistema foi projetado para incluir, e não para excluir, essa população.

A operacionalização desse cadastro ocorre em locais específicos da rede de proteção social. A pessoa deve procurar um Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP) ou, na ausência deste, um Centro de Referência de Assistência Social (CRAS). Nesses locais, assistentes sociais estão preparados para realizar o cadastro utilizando o endereço da própria instituição como "endereço de referência", garantindo que o cidadão passe a existir oficialmente para o sistema de proteção social do Estado.

Com o CadÚnico ativo e o CPF regularizado (procedimento no qual a equipe do Centro POP também pode auxiliar), o requerimento do benefício é formalizado junto ao INSS. Este pedido pode ser feito pelos canais digitais (Meu INSS) ou pelo telefone 135, muitas vezes com o auxílio direto dos profissionais da assistência social que já acompanham o caso. A condição de "situação de rua" registrada no CadÚnico serve como um alerta para o INSS sobre a urgência e a gravidade da vulnerabilidade do requerente.

Após o pedido, o INSS agendará as avaliações necessárias. A avaliação social será realizada por um assistente social do INSS, que considerará a ausência de moradia e de laços familiares como fatores determinantes da condição de miserabilidade. Se o pedido for baseado em deficiência, uma perícia médica também será agendada para constatar a existência do impedimento de longo prazo, conforme exige a lei.

O processo, embora tenha um caminho definido, pode apresentar desafios, como a dificuldade na obtenção de documentos ou negativas indevidas por parte do INSS. A complexidade da análise da deficiência ou a interpretação dos critérios de vulnerabilidade podem se tornar barreiras difíceis de transpor para quem já se encontra em uma situação de extrema fragilidade.

É neste ponto que a figura do advogado especialista em Direito Previdenciário e Assistencial se torna um diferencial decisivo. Este profissional possui o conhecimento técnico para orientar desde o primeiro passo no CRAS, garantir que o CadÚnico seja preenchido corretamente, instruir o processo administrativo com as provas adequadas e, em caso de negativa, ingressar com uma ação judicial. A intervenção de um especialista não é um luxo, mas uma ferramenta estratégica para assegurar que a lei cumpra sua função social e que o direito à dignidade chegue a quem mais precisa.