A Usucapião como Instrumento de Regularização de Terrenos: Requisitos e Provas

Usucapião

Em se tratando de regularização de imóveis, a Usucapião tem se mostrado como uma excelente ferramenta que, como já dissemos em outras passagens, pode ser utilizada não só para a conversão da posse em propriedade mas também para permitir a regularização da aquisição (derivada) de imóveis que não tiveram a formalização devidamente alcançada (especialmente quando não cabíveis outras soluções como a Adjudicação Compulsória) ou mesmo o Inventário para regularizar transmissões sucessórias. A Usucapião é sem dúvida uma solução muito abrangente disponível, reforçada com o advento da Lei 13.105/2015 que introduzindo o art. 216-A na LRP autorizou sua realização direto no Cartório do RGI, dispensando a necessidade de um Processo Judicial ("Usucapião Extrajudicial").

Através da usucapião, modo originário de aquisição da propriedade, a posse prolongada, qualificada e incontestada de um bem pode ser demonstrada (seja na via judicial, seja na via extrajudicial, quando cabível) pelo interessado que, tendo êxito na demanda, conseguirá registrar o imóvel como seu, titularizando-o. Nas hipóteses em que o objeto da usucapião for um TERRENO desprovido de edificação residencial, a comprovação do "animus domini" — a intenção de ser dono — exige uma diligência probatória ainda mais cuidadosa e robusta por parte do possuidor a fim de demonstrar, de forma inequívoca, o exercício fático dos poderes inerentes ao domínio. Não se desconhece que a edificação tem sua importância na demonstração da intenção de dono, daí que sua inexistência nos casos de Usucapião de Terrenos só representa mais desafios.

O lapso temporal exigido para a configuração da usucapião, como já sabemos, varia conforme a modalidade escolhida. Na usucapião extraordinária, prevista no art. 1.238 do Código Civil, o prazo geral é de 15 anos, podendo ser reduzido para 10 anos caso o possuidor tenha realizado no imóvel OBRAS ou SERVIÇOS DE CARÁTER PRODUTIVO. Já na usucapião ordinária (art. 1.242 do Código Civil), o prazo é de 10 anos, contanto que o possuidor detenha justo título e boa-fé, requisitos de mais difícil comprovação em cenários de posse irregular.

A principal precaução para o interessado na usucapião de um terreno reside na constituição de um robusto acervo probatório que ajude a caracterizar sua posse qualificada. Uma das providências mais eloquentes é a assunção das obrigações "propter rem", notadamente o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). É fundamental que o possuidor diligencia junto à Fazenda Municipal para apurar eventuais débitos fiscais pretéritos e proceder à sua quitação (ainda que em nome de terceiros), mantendo o pagamento dos tributos e demais taxas em dia e - importantíssimo - conservando todos os comprovantes de forma organizada, pois estes podem constituir prova robusta do "animus domini".

Atos materiais de conservação e exteriorização da posse são imprescindíveis também aqui no caso da Usucapião de Terrenos: a construção de cercas ou muros para delimitar o perímetro do terreno não apenas protege a posse contra turbação ou esbulho, mas também a torna pública e notória perante a comunidade. Da mesma forma, o cultivo de plantas, árvores, a construção de poço - ou quaisquer outras benfeitorias que tragam utilidade ou conservem o bem - como a limpeza periódica, a terraplanagem ou qualquer outro serviço de manutenção ou melhoria realizado no local devem ser meticulosamente documentados, guardando-se as respectivas notas fiscais de materiais e os recibos de pagamento de mão de obra.

O conjunto probatório nos casos de regularização por Usucapião é um aspecto crucial e deve ser complementado por outros elementos de convicção. De fato, ninguém "tem" um imóvel por 15 ou 10 anos e não tem muitas provas disso. Não é razoável: 15 anos não são 15 dias. É tempo suficiente para que o interessado produza muitas provas. Registros fotográficos datados, que demonstrem a evolução dos cuidados com o terreno ao longo do tempo, possuem grande valor visual e cronológico. Somado a isso, a prova testemunhal é de valorosa importância, devendo ser arroladas testemunhas, preferencialmente vizinhos, que possam atestar em juízo, de forma coesa e verossímil, a natureza pública, contínua e pacífica da posse exercida pelo autor da demanda pelo período legalmente exigido.

PORTANTO, temos como plenamente viável a regularização de terrenos mesmo desprovidos de moradia, por meio da usucapião - judicial ou extrajudicialmente - sendo importante que o interessado mantenha uma conduta proativa, formando um considerável conjunto probatório que embase seu pedido tão logo preencha o tempo de posse qualificada. Outro não deve ser o resultado ao final senão a procedência e o sucesso da demanda, como se vê da decisão abaixo:

"TJRS. 70078461522. J. em: 25/10/2018. APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO (BENS IMÓVEIS). AÇÃO DE USUCAPIÃO. TERRENO BALDIO. MODALIDADE EXTRAORDINÁRIA GERAL. ART. 1.238, CAPUT, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. REQUISITOS PREENCHIDOS. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. I. Conjunto fático-probatório que indica a presença do animus domini, bem como a ausência de qualquer oposição, havendo mansidão, pacificidade e continuidade na posse exercida pelos autores, os quais cercaram, limparam, pagaram os tributos e vêm cuidando de terreno urbano há mais de 15 anos. II. O fato de os usucapientes terem se descuidado quanto à limpeza do terreno por algum tempo não tem o condão de, por si só, gerar a improcedência do pedido, considerando que a usucapião foi postulada na inicial com amparo na modalidade extraordinária geral, para a qual não se exige que o usucapiente utilize o imóvel (nele more e/ou retire seu sustento). Por certo que função social sempre deve ser dada à posse e, no caso, houve a pretensão de construir no imóvel, contudo, esbarrada nas licenças municipais, já que não havia título de propriedade. III. Preenchidos os requisitos do art. 1.238, caput, do Código Civil, merece ser julgado procedente o pedido inicial. RECURSO PROVIDO À UNANIMIDADE".