O Cartório está pedindo "habite-se" e CND para a Usucapião Extrajudicial. E agora?

A Usucapião é uma forma ORIGINÁRIA da aquisição da propriedade. Não se adquire DE ALGUÉM mas sim CONTRA ALGUÉM. Alguém "perde" (a titularidade e propriedade) do imóvel e outro o "ganha" a partir do preenchimento dos requisitos legais exigidos para a modalidade de prescrição aquisitiva em questão. É importante partir dessa concepção pois, ainda que veiculada no meio EXTRAJUDICIAL na forma do art. 216-A da Lei Registrária, não deverão mesmo os Oficiais do Tabelionato ou Registro de Imóveis - e especialmente seus atenciosos e prestativos prepostos - lançar exigências descabidas e incompatíveis com a natureza da aquisição imobiliária que estão cuidando...

O "HABITE-SE" é o documento pelo qual a Municipalidade atesta o imóvel foi construído e está de acordo com as exigências estabelecidas pela prefeitura para a aprovação de projetos. As CND's - Certidão Negativa de Débito - também certificam a regularidade e inexistência de débitos, sendo requeridas para diversas finalidades.

O art. 20 do Provimento CNJ 65/2017 define expressamente que não deve ser exigido "HABITE-SE" para os casos de Usucapião Extrajudicial:

§3º. A abertura de matrícula de imóvel edificado independerá da apresentação de habite-se".

A doutrina especializada, a qual abraçamos, entende que de fato, em se tratando de USUCAPIÃO não deve mesmo haver exigência de HABITE-SE e CND, justamente por se tratar de aquisição originária. Ora, o STF (RE 422.349) já teve oportunidade de destacar que à aquisição orginária (usucapião) não deve mesmo ser exigidos outros requisitos além dos exigidos na Lei (oportunidade em que se discutia sobre a possibilidade de usucapião em áreas menores que a FRAÇÃO MÍNIMA de parcelamento municipal).

Ensina MARCELO COUTO (Usucapião Extrajudicial. 2019):

"O que o CNJ permitiu é que se faça a publicidade de uma SITUAÇÃO DE FATO, consistente na existência de edificação no imóvel. Isso não significa que essa construção está em conformidade com as normas municipais, nem que se encontra em condições seguras de moradia ou uso comercial. (...) A atuação do REGISTRADOR, ao publicizar as edificações existentes, deve se pautar pela TRANSPARÊNCIA da informação, deixando claro que: a) existe uma construção; b) não foi apresentada certificação de respeito às normas municipais nem a construção tem condições seguras de uso; e c) não foi comprovado o recolhimento da contribuição previdenciária relativa à área construída. Assim, caberá ao Oficial de Registro constar, em averbação autônoma, a existência da edificação relatada pelo usucapiente, com todas essas informações".

A jurisprudência mineira já tratou da questão:

"TJMG. 10016140047818001. J. em: 13/11/2014. USUCAPIÃO ORDINÁRIA - HABITE-SE - DOCUMENTO DISPENSÁVEL PARA O RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO AQUISIIVA - SENTENÇA CASSADA. Para a declaração da USUCAPIÃO extraordinária prevista no artigo 1.238 do Código Civil é necessária a demonstração inequívoca da posse mansa, pacífica e ininterrupta durante o período temporal legalmente exigido, pelo que o "HABITE-SE", licença concedida pela autoridade administrativa municipal, para que o imóvel edificado de acordo com os requisitos legais seja ocupado para o fim a que se destina, NÃO SE TRATA DE DOCUMENTO INDISPENSÁVEL à instrução da ação".