Sim - a gente aprende ainda nos bancos da faculdade que a posse ("ex locato") advinda dos imóveis objeto de locação não terão o condão da posse qualificada ("ad usucapionem") de possibilitar ao locatário a usucapião. O que nem todo mundo aprende (ou lembra) é que, porém, o CCB/2002 mantendo preceito do CCB/1916 reza em seu artigo 1.203 que "Salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o mesmo caráter com que foi adquirida". Assim, havendo prova em contrário é possível admitir que o caráter da posse (por exemplo, tida através do contrato de locação) pode se modificar a ponto de permitir a usucapião. Não destoa desse entendimento a jurisprudência e a doutrina, senão vejamos:
"(...) a posse decorrente de um contrato de locação pode se transfigurar ao longo do tempo, com a alteração do ânimo do possuidor a respeito do bem. É o que se chama de “interversão dos caracteres da posse”. A posse passa a ser exercida nos termos da vontade do possuidor, à revelia de seu proprietário" . (TJRJ, AP 0009816-46.2015.8.19.0205. 21ª Cam. Cível. J. em 27/11/2018)
"(...) nada impede que o caráter originário da posse se modifique" , motivo pelo qual o fato de ter havido no início da posse da autora um vínculo locatício, não é embaraço ao reconhecimento de que, a partir de um determinado momento, essa mesma mudou de natureza e assumiu a feição de posse em nome próprio, sem subordinação ao antigo dono e, por isso mesmo, com força ad usucapionem ". (REsp 154733/DF. Rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA. J. em 05/12/2000).
Enunciado 237 do CEJ:
“É cabível a modificação do título da posse - interversio possessionis - na hipótese em que o até então possuidor direto demonstrar ato exterior e inequívoco de oposição ao antigo possuidor indireto, tendo por efeito a caracterização do animus domini.”
Ocorrendo e, sendo cabalmente demonstrada, a mudança no caráter da posse - e somado a isso a presença dos demais requisitos legais aplicáveis à espécie - o reconhecimento da Usucapião será medida a ser adotada, judicial ou extrajudicialmente.
