Comprou imóvel? Entenda a Devolução do ITBI pago a maior e o Tema 1113 do STJ.

Devolucao ITBI

A aquisição de um imóvel no Brasil é um processo que envolve diversas etapas e, invariavelmente, a incidência de tributos. Entre eles, destaca-se o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), de competência municipal. Por anos, a definição da base de cálculo deste imposto gerou intensos debates e insegurança jurídica, com municípios frequentemente arbitrando valores que destoavam do preço real da transação. Contudo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Tema Repetitivo 1113, trouxe clareza e segurança, estabelecendo diretrizes que protegem o contribuinte de arbitramentos fiscais abusivos. Este artigo detalha as teses firmadas e suas implicações práticas.

A Controvérsia Anterior e a Necessidade de Pacificação:

Historicamente, a base de cálculo do ITBI, conforme o artigo 38 do Código Tributário Nacional (CTN), é o "valor venal dos bens ou direitos transmitidos". A interpretação dessa expressão, no entanto, era o ponto nevrálgico. Muitos municípios utilizavam (e alguns ainda teimam e utilizar, ainda hoje!) valores de referência (pautas fiscais) ou o valor venal para fins de IPTU como base para o ITBI, ignorando o valor efetivo da transação imobiliária. Tal prática gerava uma carga tributária indevida e inúmeras demandas judiciais.

O Marco do Tema 1113 do STJ: Teses Firmadas:

Em 24 de fevereiro de 2022, o STJ, ao julgar o Recurso Especial nº 1.937.821/SP (Tema 1113), sob o rito dos recursos repetitivos, pacificou a questão, fixando três teses essenciais que devem ser observadas por todos os entes municipais:

  1. "A base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação;". Esta tese é crucial. Ela desvincula a base de cálculo do ITBI do IPTU, impedindo que o valor venal para IPTU seja um "piso" para o ITBI. O foco é o "valor de mercado" do imóvel no momento da transação. O valor de mercado, em regra, é o preço pelo qual o imóvel foi efetivamente negociado entre as partes.
  2. "O valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN);". Aqui reside uma das maiores garantias ao contribuinte, em perfeita consonância e complemento à tese anterior: o valor declarado na ESCRITURA PÚBLICA de compra e venda possui presunção de veracidade. Para que o Fisco Municipal possa contestar esse valor e arbitrar outro, é obrigatória a instauração de um processo administrativo fiscal, nos termos do artigo 148 do CTN (e é importante observar que na grande maioria das vezes o Município não instaura o procedimento, apenas arbitra unilateralmente um valor!). Neste processo administrativo, deve ser garantido ao contribuinte o contraditório e a ampla defesa, com a apresentação de critérios técnicos e fundamentados para a reavaliação. A simples imposição de um valor superior sem esse rito é ILEGAL.
  3. "O Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido de forma unilateral.". Esta tese fulmina a prática comum de muitos municípios de utilizarem "tabelas de valores" ou "valores de pauta" genéricos e unilaterais para fixar a base de cálculo do ITBI. O arbitramento prévio e sem fundamentação específica para cada imóvel é considerado ILEGAL, pois desconsidera as particularidades de cada transação e a presunção de boa-fé do contribuinte.

Implicações Práticas para o Contribuinte:

As teses do Tema 1113 representam uma vitória significativa para os contribuintes e para a segurança jurídica. Agora, o valor da transação declarado na escritura pública é o ponto de partida para o cálculo do ITBI. Caso o município discorde, deverá seguir o rigoroso procedimento do art. 148 do CTN, com processo administrativo e ampla defesa.

Se o ITBI foi pago com base em um valor arbitrado unilateralmente pelo Fisco, sem o devido processo administrativo, o contribuinte tem o direito de pleitear a repetição do indébito tributário, ou seja, a restituição do valor pago a maior, devidamente corrigido.

Prazo Prescricional para a Repetição do Indébito:

É de suma importância que o contribuinte esteja atento ao prazo prescricional para pleitear a restituição do ITBI pago indevidamente. Conforme o artigo 168, inciso I, do Código Tributário Nacional (CTN), o direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de cinco anos.

O marco inicial para a contagem desse prazo é a data da extinção do crédito tributário, que, no caso de pagamento indevido, ocorre com o pagamento efetivo do tributo. Portanto, o contribuinte possui cinco anos, a contar da data em que efetuou o pagamento do ITBI a maior, para ingressar com a ação judicial de repetição de indébito. A inobservância deste prazo implica na perda do direito de pleitear a restituição, tornando o crédito irrestituível.

A Importância de Consultar um Advogado Especialista:

Embora o Tema 1113 do STJ seja claro, a aplicação prática de suas teses pode envolver nuances e exigir conhecimento técnico-jurídico aprofundado. A análise da documentação, a verificação da legalidade do lançamento fiscal e a eventual propositura de uma Ação de Repetição de Indébito demandam expertise em Direito Tributário e Direito Imobiliário.

Um advogado especialista poderá:

  1. Analisar seu caso específico e determinar se houve cobrança indevida.
  2. Orientá-lo sobre os documentos necessários para comprovar o valor da transação.
  3. Representá-lo em eventuais discussões administrativas ou judiciais contra o Fisco Municipal.
  4. Garantir que seus direitos sejam plenamente exercidos e que a restituição do imposto pago a maior seja efetivada, observando rigorosamente os prazos prescricionais para evitar a perda do direito.

Não hesite em buscar aconselhamento jurídico qualificado para proteger seu patrimônio e garantir a correta aplicação da lei.

Conclui-se, portanto, que o Tema 1113 do STJ é um divisor de águas na tributação do ITBI, reforçando a legalidade e a proteção ao contribuinte. Ao estabelecer que o valor da transação é a base de cálculo, salvo comprovação em processo administrativo, e vedar o arbitramento unilateral, o Superior Tribunal de Justiça consolida um ambiente mais justo e previsível para as operações imobiliárias. É fundamental, contudo, que o contribuinte esteja ciente do prazo prescricional de cinco anos, contado do pagamento, para buscar a restituição de valores pagos indevidamente. Mantenha-se informado e, em caso de dúvidas, consulte sempre um profissional do Direito.